Um filme que tem tudo pra dar certo.
Quando espio A PORTA AO LADO, longa brasileiro da noite de terça-feira no 50° Festival de Cinema de Gramado, é crucial ressaltar essa não é uma história de amor, é uma história do amor.
Um filme que tem tudo pra dar certo: as mulheres, interpretadas pelas conhecidas da tevê, Mari (Letícia Colin) e Isis (Bárbara Paz), possivelmente são o que cativa o desconhecido a se aventurar pela primeira vez nesse filme. Ambas queridinhas da emissora dos cem milhões de uns, dividem (ou, então, compartilham) espaço com Rafa (Dan Ferreira) e Fred (Tulio Starling), em uma história delicada que acompanha os casais em suas rupturas.
Os homens, por sua vez, não tão conhecidos assim, a princípio só deixam espaço para um único pensamento: de onde já os vi antes e por que não os vi mais vezes?. A atuação de Bárbara, como sempre, é como uma música do Imagine Dragons lançada nos últimos cinco anos: já vimos antes, já choramos antes, já amamos antes, não é nada totalmente novo e, não obstante, é exatamente por isso que gostamos tanto: dançamos novamente. Gigante, Bárbara nos guia mais uma vez pelo grande psycho killer, quesquecê pessoal que sua personagem no seu mundo próprio carrega; dessa vez, acompanhada de Fred (Starling), Isis (Paz) traz um grande choque de realidades. Na sinopse oficial, lida com uma entonação de suspense pelo jornalista e apresentador Roger Lerina, conta:
Rafa e Mari são casados e vivem um matrimônio tradicional e estável. A união segue tranquila até o dia em que o casal Fred e Isis se muda para o apartamento ao lado. Os novos vizinhos são adeptos de um relacionamento aberto, separam sexo de amor e decidiram não ter filhos. Esta forma de se relacionar desafia e provoca Mari, que começa a questionar o seu casamento.
Um choque de realidade não tão esperado vindo da diretora Júlia Rezende: diretora do tão controverso Depois a Louca Sou Eu (2021), a Melhor Comédia do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro 2022, não se acha muitas semelhanças entre as duas obras que possam relacionar e justificar tão diretamente que sejam da mesma diretora, por exceção de seus cenários bem detalhados e, talvez, o cansativo product placement obrigatório do Telecine que, graças à curiosidade da jornalista do Correio do Povo, sabemos que trouxe um nome a mais para os créditos do longa. Seus cenários, mais uma vez, soam como uma boa escolha de locação, algo que também acontece em Inmersión
O longa, simples, situado entre suas cinco locações, parece de longe um Story of a Marriage. O filme é baseado em diálogos, emoções naturalistas e vários momentos de desconfiança, coisa que os atores conseguem lidar muito bem. Com uma participação especial aqui, outra ali, o filme tem um elenco pequeno e foi gravado completamente durante o período de isolamento social. A produtora Mariza Leão fala sobre isso no debate que ocorre dia após a noite de exibição do longa, Leão conta que a rotina da produção, que chegou a ter um “luz, câmera, máscara, ação” para substituir o clássico bordão dos diretores, a emocionou por perceber a intensa dedicação dos atores em trazer a obra à vida. Leão aponta como um comprometimento aquém do esperado vindo dos atores o ato deles saírem do seu isolamento e sua proteção para irem ao set entrar nos personagem– não por acaso, já que o longa conta com diversas cenas de intimidade, das quais ela destaca as cenas “se lambendo”. Destaco também a trilha sonora, que não parece ter muito mais do que duas ou três melodias, mas acompanha nossos casais de uma forma um tanto quanto profunda.
Vejo um grande erro do filme quando se fala das telas: em produções hollywoodianas, há um cargo específico para quem cuida disso– não se vê esse cuidado neste filme. É perceptível quando estamos olhando para o celular de verdade e para um tracking, por exemplo. Devido a ser um filme feito para passar no cinema, mantive uma expectativa de que o cuidado com as telas seria um pouco maior, até porque estamos de olho em uma tela gigante e podendo, perfeitamente, perceber onde os dedos estão na hora da digitação. Ainda não chega nem perto dos erros de continuidade de Love, Victor, por exemplo, mas se vê pouco cuidado nessa área.
Ao fim, o filme traz a pergunta tão feita diariamente sobre os relacionamentos livres: quem é mais feliz? A diretora conta que diversos amigos seus se sentiram “escritos” quando, na verdade, a história não era nem se manteve em cima da vida de ninguém: apenas um grande estereótipo que, por sorte, coube em muitas pessoas. O filme erra em trazer a traição como ato de coragem, mas acerta aos montes quando resolve botar nome a cada um dos bois da tal “traição”.